Antonio Francisco Costa - Advogados Associados

PLANOS DE SAÚDE – Doenças Preexistentes

mar 30, 2012   //   by afc@admin   //   Artigos  //  No Comments

*Danniel Allisson da Silva Costa

Consoante estabelece a Constituição Federal, a partir do seu artigo 196, a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

 O direito a saúde constitui, portanto, um direito fundamental do cidadão. Na análise justa e precisa de José Afonso da Silvain Comentário contextual à Constituição, 6ª Ed. Malheiros -, pela norma constitucional significa dizer que nos casos de doença, cada um tem direito a tratamento condigno de acordo com o estado atual da Ciência Médica, independentemente de sua situação econômica, sob pena de não ter muito valor a sua consignação em normas constitucionais.

 É a partir da interpretação simples da norma constitucional que o mencionado mestre constitucionalista destaca, ainda: A SAÚDE É UM DIREITO FUNDAMENTAL DO SER HUMANO, DEVENDO O ESTADO PROVER AS CONDIÇÕES INDISPENSÁVEIS AO SEU PLENO EXERCÍCIO, asseverando que: a norma do art. 196 é perfeita, porque estabelece explicitamente uma relação jurídica constitucional em que, de um lado, se acham o direito que ela confere pela cláusula, “a saúde é direito de todos”, assim como os sujeitos desse direito, expressos pelo signo “todos”, que é signo de universalização, mas com destinação precisa aos brasileiros e estrangeiros residentes.

 Ora como o Estado se apresenta insuficiente e claramente descomprometido com esse dever, o cidadão, na justa e racional defesa do seu bem estar e da própria vida, vê-se compelido a buscar, nos Planos de Saúde ou Seguro Saúde, alternativas que complementem a assistência devida pelo Estado, o que acaba sendo um necessário substitutivo. Como disciplina a norma constitucional o dever do Estado de garantir a Saúde consiste na formulação de políticas econômicas e sociais que visem a redução de riscos de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.

É claro que o Estado, no efetivo exercício do poder de regulamentação, estabeleceu através do artigo 2º, §2º, da Lei nº 8.080/1990, chamada “Lei Orgânica da Saúde” que, “o dever do estado não exclui o das pessoas, da família, das empresas e da sociedade”, mas este dever é complementar e não substitutivo do dever que é do Estado.

A contratação de um Seguro Saúde ou Plano de Saúde é, portanto, a contratação de um serviço de saúde complementar ao serviço que é devido pelo Estado e não um substitutivo do serviço devido pelo Estado. Não está o cidadão renunciando ao direito constitucional da assistência médica devida pelo Estado, mas, sim, buscando um reforço, um complemento àquela assistência quando se fizer necessária.

Não há óbice, inclusive, à contratação do Seguro Saúde, a possível pré-existência de uma doença. Todavia, quando o cidadão contrata, então, um Seguro Saúde ou Plano de Saúde, deve ter a cautela de analisar, em consonância com a legislação específica, os termos contratuais quanto ao disciplinamento da forma de cobertura ou assistência no tratamento de possíveis doenças pré-existentes.

Como é da praxe comercial, sempre, no ato da contratação do Plano de Saúde, o cidadão contratante preenche uma Declaração de Saúde, indicando as possíveis doenças que sabe ser portador, inclusive se já se submeteu a algum tipo de cirurgia etc..

Tem-se, pois, como doença ou lesão preexistente, aquela patologia que o cidadão contratante, ou seu representante, saiba ser portador ou sofredor à época da contratação do Plano de Saúde.

É preceito legal a que se submetem as Operadoras de Planos de Saúde o dever de dar cobertura a doenças e lesões pré-existentes, podendo estabelecer um prazo máximo de carência para atendimento, nesta hipótese, de 24 meses.

Durante o período fixado contratualmente como de carência, tem-se o contrato como de cobertura parcial temporária, no qual o associado não terá cobertura para procedimentos de alta complexidade.

Assim o contratante deve informar a existência de doença ou doenças ou lesões pré-existentes, quando do preenchimento da Declaração de Saúde. A inobservância desse dever poderá ensejar a suspensão ou rescisão do contrato, podendo, entretanto, o contratante, em discordando do ato rescisório unilateral, solicitar a abertura de um processo administrativo na ANS – Agência Nacional de Saúde Complementar -, para julgamento do conflito, hipótese em que o contrato se manterá em vigor até o resultado do julgamento.

A operadora do Plano de Saúde, contudo, poderá comprovar que o contratante tinha, efetivamente, conhecimento prévio da doença ou lesão pré-existente e não a informou, o que se constituirá na comprovação de uma fraude praticada pelo contratante consumidor.

Destaca-se, entretanto, que mesmo nos casos da fraude comprovada, a operadora não poderá suspender ou rescindir o contrato durante o período de uma eventual internação do beneficiário do Plano de Saúde, porém, as despesas efetuadas com o tratamento da doença ou lesão pré-existente serão consideradas de responsabilidade do contratante fraudador.

As doenças pré-existentes declaradas ficam sujeitas a carência para utilização dos chamados benefícios de COBERTURA PARCIAL TEMPORÁRIA, cujo prazo máximo de carência é de 24 meses. Após, ultrapassado esse período, a cobertura passará a ser integral, na forma legal e nos termos do Plano contratado.

Assim é que, com fundamento no Princípio da Boa Fé, o consumidor está obrigado a informar à Operadora do Plano de Saúde que pretende contratar, desde 04.11.1998, quando foi regulamentada a matéria, o conhecimento de doenças ou lesões pré-existentes. A negativa da informação, desde que conhecida a pré-existência, ensejará fraude e conseqüentemente a suspensão ou rescisão do respectivo contrato.

Inclusive, em razão do Princípio da Boa Fé objetiva, é que inúmeras tem sido as decisões judiciais que tem afastado a necessidade da realização do prévio exame médico. Isto porque, em razão do referido Princípio da Boa Fé objetiva, deve ser entendida como verdadeira a declaração prestada pelo beneficiário no ato da contratação do Plano de Saúde.

Tal entendimento nada mais é do que a perfeita interpretação do Art. 765 do Código Civil, que assim dispõe: O segurado e o segurador são obrigados a guardar na conclusão e na execução do contrato, a mais estrita boa fé e veracidade, tanto a respeito do objeto como das circunstâncias e declarações a ele concernentes”.

 Nessa mesma linha é o disposto no Art. 422 do Código Civil. Vejamos:Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa fé.”

 Não foi à toa que o legislador trouxe em dois artigos o Princípio da Boa Fé nas relações contratuais e é em razão disto que os exames prévios, anteriormente exigidos no ato da contratação de um seguro de saúde ou outro tipo de seguro relacionado à pessoa, passou a não ser mais exigido, bastando para tanto a simples declaração dos contratantes, que devem ser feitas respeitando-se sempre o princípio da boa fé.

E para dar segurança às relações contratuais, foi que o legislador, com o objetivo de extirpar qualquer possibilidade de má-fé, assim dispôs no Art. 766 do Código Civil: Se o segurado, por si ou por seu representante, fizer declarações inexatas ou omitir circunstâncias que possam influir na aceitação da proposta ou na taxa de prêmio, perderá o direito à garantia, além de ficar obrigado ao prêmio vencido.”

No direito contratual contemporâneo, o Princípio da Boa Fé objetiva talvez seja o seu principal pilar. De acordo com este princípio, as partes que contratam entre si têm um dever recíproco de agir com lealdade e cooperação, abstendo-se da prática de qualquer ato que possa esgotar as expectativas contratuais da outra parte.

Cumpre ressaltar, todavia, que a Boa Fé objetiva não diz respeito ao estado mental do agente, mas sim ao seu comportamento. A Boa Fé objetiva exige que o agente coopere para a consecução dos objetivos do negócio jurídico e constitui elemento de interpretação do contrato, visando à apreciação da conduta das partes na celebração e na execução de suas obrigações contratuais. Exige-se das partes que se conduzam com lealdade e honestidade, que esclareçam reciprocamente os fatos referentes ao contrato e o conteúdo das cláusulas contratuais, visando à manutenção do equilíbrio contratual e evitando o enriquecimento sem causa.

Por sua vez, a veracidade das informações prestadas pelo contratante no preenchimento da proposta adquire importância ímpar, considerando-se que essas declarações serão o fundamento para a aceitação – ou não – da proposta pelo segurador e, futuramente, em caso de utilização dos serviços antes de cumpridos os prazos de carência, constituirão também o fundamento para a aferição da Boa Fé do contratante no momento da contratação do seguro.

Porque o Princípio da Boa Fé objetiva deve necessariamente reger a conduta do contratante do seguro, nos termos dos artigos 422 e 765, do Código Civil, transcritos anteriormente, nada justifica que o segurador desconfie das declarações prestadas pelo interessado. Rememorada a regra de que a Boa Fé é sempre presumida, uma vez prestadas as informações pelo proponente, é de se tê-las como verdadeiras, sob a presunção de sua estrita Boa Fé, em obediência ao dever legal que lhe é imposto.

Deve-se prestigiar a Boa Fé na relação contratual. Não é razoável exigir que as seguradoras realizem um check-up completo em todos os candidatos a segurado. Deve-se partir do Princípio da Boa Fé.

Para Sílvio de Salvo Venosa, “(…) a Boa Fé objetiva se traduz de forma mais perceptível como uma regra de conduta, um dever de agir de acordo com determinados padrões sociais estabelecidos e reconhecidos”. (VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. São Paulo: Atlas, 2003,p.379).

  Portanto, para fins de diferenciação dos casos em que a cobertura é devida daqueles em que não o é, a verdadeira discussão a respeito da doença pré- existente não se refere à sua existência, mas sim ao conhecimento de sua existência pelo segurado e à sua omissão quando do preenchimento da proposta de seguro.

                         A conduta do proponente, de omitir deliberadamente a doença de que se sabe acometido, comprova a sua intenção de burlar o seu dever de informação e retira do segurador a possibilidade de decidir se o aceita ou não no grupo nas suas reais condições da saúde. Essa conduta caracteriza a má-fé do proponente e permite a negativa de cobertura por parte da Seguradora.

Em suma, ao prestar declarações sabidamente falsas a respeito de suas condições de saúde, aí incluída a omissão a respeito de moléstias de que se sabe ser acometido, de procedimentos e tratamentos médicos a que se tenha submetido e de internações e intervenções cirúrgicas sofridas, o proponente gera um desequilíbrio na relação jurídica contratual que justifica a negativa de cobertura por parte da Seguradora em razão das falsas informações prestadas.

 

*Danniel Allisson da Silva Costa, Advogado, Especialista em Direito Empresarial, Pós-graduado pela Universidade Federal da Bahia, Sócio Coordenador do Escritório ANTONIO FRANCISCO COSTA Advogados Associados. 

 

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